quarta-feira, 24 de julho de 2013

Em silêncio

Era um começo de tarde como outro qualquer, como um sábado qualquer, eu voltava da faculdade, caminhando passos rápidos e displicentes, ora olhando um pouco o movimento, mas sempre com mais atenção na música que ouvia nos fones de meu celular. Foi quando, aproximando de casa eu a vi, meio que de soslaio, a quase um quarteirão de distância, caminhando em minha direção. Óbvio que não desviei meu caminho, tão pouco esperei por ela, apenas segui em frente, ignorando totalmente sua existência, como se tivesse visto mais uma pessoa desconhecida caminhando pela rua e, em pouco tempo, já até havia esquecido com quem me deparara há alguns instantes. Mas o que realmente foi intrigante e interessante ocorreu no decorrer daquele sábado parado, calado, distante e ouso dizer até inseguro...
Por volta das quatro da tarde, eis que meu telefone toca, quando olhara pude perceber que a pessoa havia escondido o número, pensei que fosse o mesmo número que me ligara na noite passada e que não disse nada. Atendi,  sempre otimista pensando na possibilidade de ser um novo trabalho mas em vão, novamente a pessoa ficara em silêncio desligando depois de alguns instantes. Alguns poucos minutos depois,  chega uma mensagem de texto dizendo: “finge que nem me conhece, estava com saudades de te ver” Não demorou mais do que um minuto para ligar a ligação, a mensagem e o ocorrido da manhã, logo respondi a mensagem com afinco e depois de uma breve conversa combinamos de nos encontrar.
Era noite, por volta de 19h, a hora se aproximava, turbilhões de pensamentos me estonteavam, deles os mais presentes talvez seria de alguns drinks e quem sabe nossos lábios tocando-se em uma dança frenética e majestosa de beijos e palavras de afeto trocadas. Arrumei-me e em pouco tempo estava em sua casa, fui convidado para entrar, ela estava sozinha.
Devo admitir, estava tão bela como sempre foi. Sua pele alva, macia, sedutora e chamativa, seu cheiro doce, insaciável, penetrante e convidativo, criando desejo a cada respiração, tornando-a ofegante e delirante. E seus cabelos... Vermelhos, intensos, mais até do que me lembrava, realçava ainda mais sua pele branca, estava deslumbrante em vestes negras bem detalhadas e delineadas sob medida em seu corpo. Em pouco tempo de conversa e minhas expectativas sobre a noite já se realizavam, alguns drinks e nossos lábios saudando-se em uma dança de paixão esquecida, mas não apagada.
Alguns instantes depois sua linda pele branca revelou-se não sendo nada além de uma casca oca, alterando entre partes vazias e podres, seu perfume que antes dominava todo o quarto foi um breve momento para esconder o cheiro fétido de sua podridão por dentro exaltando-se para fora pela boca, nariz e olhos, vísceras dilaceradas apodrecidas, inconstantes, clamando por carne nova para sugar seu sangue e esconder o que há e pior em si, camuflando sua verdadeira natureza insípida.
Em um movimento rápido e sutil, minha mão fora instintivamente em seu rosto, percorrendo seu pescoço até sua garganta, e lá permanecera apertando com toda força que meu ódio e repulsa puderam me proporcionar. Em poucos instantes seu rosto ficou ainda mais pálido, sem reação, sem palavras, sem saber o que fazer diante daquilo tudo.
Olhando em seus olhos, pude me lembrar de cada palavra dita, de cada instante de dor e agonia que passei, de cada segundo que esperei em agonia por uma resposta, de quando me abri expondo todas as minhas férias e ela me esfaqueou, machucando-me ainda mais. Lembrei-me das falsas palavras, das falsas promessas, do que ela era, o que havia se tornado, uma mutação macabra e horrenda, não merecida por ninguém, sequer alguém como ela. Lembrei-me principalmente de seu silêncio, sua indiferente falta de respostas apenas olhando, admirando-me enquanto me arrastava no chão por sua causa.
-Você acha mesmo que iria voltar como um cachorro atrás do dono? – Eu dizia enquanto apertava seu pescoço cada vez mais forte.
-Você me teve totalmente, por mais tarde que tenha sido eu me entreguei totalmente, mesmo que tenha sido por um medo ridiculamente tosco de ficar sozinho... Talvez isso pudesse despertar algo maior, e o que você fez? Preferiu pisar em mim e me desprezar, na única oportunidade que tive que realmente tivemos de que eu pudesse verdadeiramente me abrir e me entregar totalmente a você, e o que você fez? Preferiu me iludir... E agora acha que eu iria ignorar tudo e voltar como um cãozinho faminto atrás de comida, esquecendo e perdoando tudo que aconteceu no passado? Acha que não me lembro de cada palavra, e pior, cada silêncio indiferente que fui tratado?
E em poucos instantes seu rosto fora se tornando ainda mais pálido, algo saia de sua boca e misturava-se com seus cabelos, tornando-os ainda mais vermelhos, criando uma dança de cores e densidades inconfundíveis, e aos poucos percebia seu corpo tentando lutar contra minha força e quanto mais ela se debatia, mais eu me lembrava de como me debatia, e maior era a raiva que sentia, até que, aos poucos, começou a se acalmar, entrando em um estado de sonolência, toda a dor logo se entorpecera, seu corpo já estava praticamente parado, não havia mais forças para lutar ou sequer manter os olhos abertos.
De sua boca entreaberta saiam grunhidos embolados e inaudíveis, sequer dei atenção ao que poderia ser, suas palavras venenosas não mais me ludibriariam. Em pouco tempo suas tentativas de sair ou de falar o que quer que seja sessaram-se, fiquei admirando seus olhos, suas pupilas dilatadas, quase sem reação, a pulsão de seu corpo esvaindo-se, em breve tudo terminaria. Pensei em tudo que aconteceu, a forma que tudo se tornara, o final amargo, não existiria alternativa.
Abaixei-me bem próximo de sua boca, nossos lábios quase se tocaram pela última vez, mas não haveria última vez. Na reminiscência de minha raiva, aproximei-me de seus ouvidos, para que ela pudesse ouvir minhas últimas palavras.  Soltei seu pescoço, ela se mostrou aliviada, mas não tinha forças para sequer gritar ou se levantar. Disse-lhe ao pé do ouvido
-Ainda doí quando digo que te amo? Pois eu te amo, tanto que doí, te amo tanto, até a morte.
Minhas mãos caminharam novamente em seu rosto até seu pescoço, onde apertei com todas as minhas forças, até não ter mais forças. Ela simplesmente não reagiu, deixou toda sua velha conhecida displicência tomar controle da situação, este era seu destino, sua própria cova cavada, sua sina com meu nome. Quanto terminei, já não conseguia mais sentir minhas mãos, meus dedos pareciam ter ficado cravados em seu pescoço, meu corpo tremia, tive vontade de gritar, ressuscita-la apenas para mata-la novamente. Poético.
Antes de sair do quarto, olhei novamente para seu corpo, não sabia se ainda vivia ou não, não pensei em nenhuma possibilidade, apenas fitei-a e disse:

-Eu nunca lhe amei.

terça-feira, 16 de julho de 2013

Devaneios

Pequenos devaneios passam por aqui
Palavras tolas sem sentido
Sentimentos, sentido, cru, despido
Crescendo em ritmo acelerado e desinibido

Como por hora celebrando uma canção
Palavras cheias e vazias, profanadas
Ditas com os olhos, mãos e coração
E por ventos e vinhos embaladas

Embriagadas por todos meus anseios
Não mais, são apenas meros devaneios

segunda-feira, 1 de julho de 2013

(in)Direta

Você disse, (re)disse
Gritou, falou e até revirou
Depois apenas se calou
E calada permaneceu...
Nesse silêncio displicente
De rotinas incoerentes
Mas meu bem, tenho algo a dizer
Aquela indireta não foi para você

Mosca

Diário do Dr. Fleubermann Paciente nº 003764 Curioso e peculiar o caso deste paciente em específico. Ainda me lembro bem da primeir...